Pode
um HOMEM chegar à meia idade sem se lembrar
de qual foi a última vez que fez algo movido pela paixão? Movido pela escolha
autônoma e legítima do seu coração? Este é Jean-Louis Joubert!
Pode
uma MULHER do campo, no afã de
atender as supostas expectativas de um homem citadino e de uma sociedade
burguesa, esquecer-se de sua essência caipira/camponesa, fundamental para mantê-la
centrada e em harmonia com seu próprio ser, de posse do seu poder criativo?
Esta é Suzanne!
Pode
uma IMIGRANTE deixar para traz sua
história, suas raízes, sua forma de viver cooperativa e fraternal, devido à necessidade
de “ganhar a vida” em outro contexto – estrangeiro, insalubre e explorador? Esta NÃO é Maria Gonzalez!
Eis
a diferença entre os homens!
Uns
pagam com sua felicidade na proporção em que se distanciam de sua essência,
suas raízes, suas memórias celulares primeiras. Outros, apesar das
adversidades, se mantêm fiéis a si mesmos, e por isso exalam o perfume da flor
mais cheirosa, o frescor da manhã mais amena, as cores da primavera mais tropical.
Estes últimos são capazes de despertar aqueles que adormecem sob máscaras que
não lhe são próprias.
A
empregada doméstica Maria González desperta o patrão Jean-Louis, homem
adormecido sob a máscara do burocrata francês, cuja vida morna e regrada lhe
escorre pelos dedos sem que se dê conta da eternidade de cada momento. É
preciso que algo sublime aconteça para que ele reconheça o brilho dos olhos de
Maria e suas conterrâneas, a felicidade sem causa que contagia todo o grupo de
mulheres que moram no precário e apartado sexto andar, o estado de presença
absoluto de cada uma daquelas forasteiras, primeiramente reconhecido e
apreciado em Maria, ao cozinhar seu ovo até o ponto exato ou ao impor um
salário à sua altura. Gestos e posturas simples, mas que movimentam uma energia
cheia de vida, latejante, que o faz querer viver plena e profundamente.
Imagina
um homem de meia idade que, de repente, se dá conta que a vida pode ser e é
muito mais?! Muito mais que a rotina do café da manhã predito, do ir e vir do
trabalho, da realização de um lucrativo contrato financeiro, da ampliação da
carteira de “bons” clientes. Que uma vida concomitante, complementar e latejante
acontece em nosso interior quando percebemos que nossos poros se dilatam; nosso
sangue não contenta em apenas circular pelas nossas veias, quer viajar, derrapar,
testar os limites desse túnel venoso; quando nossa pupila cresce e capta cada
nuança e cor ao redor; nossas narinas farejam odores até então jamais
percebidos; Entramos em pleno estado de beatitude. Que bela cena de Jean-Louis
com ele mesmo, num quartinho pequeno e esquecido, uma cama, um criado e um
vinho. E a vida pulsando deliciosamente na teia subatômica de seu corpo. Nada é
capaz de lhe tirar a paz proporcionada pela descoberta de ser o que se é, este
resgate e apropriação de sua própria alma. Este novo Jean-Louis começa se
apaixonando por Maria, depois por ele mesmo, e em seguida pela vida toda à sua
volta, até a borda. Nutre-se do bem estar que advém em ajudar o próximo, em
atender quem realmente precisa, em se fazer importante para alguém. Reconhece-se
realmente EXTRAordinário, alguém atento em não cair na armadilha mortal da
rotina.
Suzanne,
sua mulher, não tarda perceber que seu velho e decifrado marido está a morrer e
que um novo homem se deita ao seu lado. Esse homem, renascido, lhe faz recordar
uma jovem camponesa, autentica e feliz, que um dia existiu, despertou o
interesse de um jovem francês da cidade, e que, por supostas exigências externas,
foi colocada no baú das memórias intocadas para que pudesse surgir uma esposa alienada,
fútil e sociável, que atendesse a demanda de uma sociedade burguesa. Dá-se
conta que no afã de atender supostas expectativas do marido acabou perdendo
aquilo que lhe era mais raro e precioso, algo que é premissa para se fazer verdadeiramente
amada, sua Autenticidade.
Não
sabemos que fim levou Suzanne, mas é bem possível que reaprendeu a cuidar de
seu próprio jardim, atraindo lindas borboletas.
Quanto
a Jean-Louis e Maria, confiem em mim, viveram felizes para sempre (lembrando
que o “sempre”, sempre acaba)!
Será que o filme ... é tão bom e fascinante como este comentário?
ResponderExcluirMaravilhei-me com essa descrição e, claro, vou assistir ao filme para ver a fonte de tamanha inspiração.
Parabéns "Bailarina"! Sua dança engrandece a música!
AC
Sr. Cortez, sempre um incentivador ! Muito obrigada. Queria ter mais tempo para escrever sobre todos os filmes que me tocam. Grande abraço.
ResponderExcluirvou assistir
ResponderExcluirMuito inspirador seu comentário. Vou assistir este filme.
ResponderExcluirAh, que comentário inspirador. Agora estou louca para ver o filme!!!! Aliás, parece que você fala de alguém adormecido no ego, que desperta na compreensão de sua essência. Adorei!
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